05 abril 2018

Direto e claro: Guarapari - ES



Me lembro vagamente que tinha uns 5 ou 6 anos e estava jogando videogame (X-men) enquanto minha família e amigos conversavam na sala de estar. Me inseri no meio deles para escutar a conversa. Não me lembro o assunto, mas falavam sobre o futuro, estavam felizes e sorridentes.

Não sei se foi no mesmo dia, ou na mesma noite, mas embarcamos em uma viagem de longa duração.
Creio que fomos para Cataguases, Minas Gerais, e depois para Guarapari, Espírito Santo. Lembro de pequenos Flashs da longa viagem que fizemos.

Então estávamos em uma cidade do litoral capixaba, em uma pequena casa de um quarto, uma sala, uma cozinha e um banheiro. Minha mãe trabalhava vendendo espetinhos para conseguir alguma renda. Meu pai talvez estivesse em Curitiba, fazendo essa longa viagem 2 ou 3 quatro vezes por mês até que eles, meus pais, decidiram voltar para o Paraná.

Muita água passou, muitas mudanças aconteceram até que um determinado dia minha mãe diz para mim e para minha irmã que iria se mudar para Guarapari e já acrescenta que se não quiséssemos ir com ela, poderíamos ir morar com nosso pai, que já se encontrava em Tunas. Minha irmã categoricamente disse:

- Eu vou com você! Não largo de você. Onde você estiver, eu estarei junto.
(curioso como até hoje ela leva isso a sério)

Por um momento fiquei indeciso, mas ponderei que nunca tinha me separado de minha mãe e que morar com meu pai seria complicado, pois ele demonstrava ser uma pessoa sem qualquer paciência, extremamente rígido e inflexível, autoritário. Eu queria ficar em Curitiba, estava começando minha 6º série, estava feliz por ter alguns poucos amigos, por estar entrosado, por estar começando a descobrir a paixão por uma moça, por ... tantas coisas que me fazia ficar indeciso. Mas a saída racional para esse problema de escolha em minha mente foi "bom, estar com meu pai é ter uma pessoa que eu amo ao meu lado; estar com minha mãe e minha irmã é ter duas pessoas que eu amo ao meu lado. 2 é maior que 1".

- Eu vou com vocês.

Estava decidido. Minha mãe se agilizou para que pudéssemos levar o que fosse possível através de sacolões gigantes, tão grandes que pudessem guardar uma televisão de tubo!
Empacotamos tudo, vendemos as  mobilias e partimos para a rodoviária.

Um dia e uma noite de viagem, chegamos no destino.
Outra vida, outros amigos, outra família ...

Lá é calor todo dia. A cidade só funciona na temporada, fora dela é basicamente um deserto. A escola que eu estudava era meia hora de caminhada sobre o sol do meio dia. Todos os dias, de segunda à sexta. Alunos de outras escolas que se encontravam comigo ficavam me olhando por eu parecer ser o boneco de neve em meio a afrodescendência capixaba/carioca. Me senti incomodado por ser muito diferente daquele povo.

Na sala de aula a professora me pediu para ler um texto que tinha muitas palavras como porta, porque ... R em evidência. Sempre gostei de ler quando a professora pedia. Naquele dia me senti envergonhado por aquelas risadas do meu sotaque do sul. Tudo bem, eu superei.

Em suma, me senti reprimido pela cultura local, não me adaptei ao calor escaldante e não encontrar semelhantes. Pedi arrego a meu pai com o pretexto que queria trabalhar com ele. Poise, eu não sabia o que era trabalho. Apenas sabia que era uma palavra muito usada pelos adultos para justificar suas ausências e suas faltas. Então vim embora para Tunas do Paraná.

Apesar do processo ser igual, de adaptação, mudanças e etc., fiquei mais contente de estar em solo amigo, lugar frio. Estava em casa. Nas minhas férias escolares eu voltei a passeio para Guarapari e me diverti.

2009 - We three

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